domingo, 17 de outubro de 2021

The Quest (Yes-2021): Um álbum leve, equilibrado e bem produzido




    Uma audição descuidada pode não compreender os caminhos de um som que se atualiza à terceira década do século XXI. A banda inglesa Yes lança no ano de 2021 o álbum "The Quest". A que se propõe esta busca? Steve Howe está conduzindo o grupo desde o desencarne de Chris Squire (in memoriam), e neste lançamento, que se deu no dia 01 de outubro de 2021, ele assina a produção musical do vigésimo segundo álbum de estúdio da aclamada banda de rock progressivo.
    Realmente, "The Quest" é o primeiro álbum de estúdio da banda gravado sem a presença de Chris Squire, que faz um tanto de falta, por ser tão único e verdadeiramente insubstituível. As pessoas costumam dizer que ninguém é insubstituível, eu procuro dizer que todos são insubstituíveis, devido nossas singularidades, isso é a beleza da diversidade, cada ser é único.
    Steve Howe traz consigo uma vasta experiência de quase seis décadas de práticas de gravações, pois suas primeiras experiências em estúdio datam de 1964, quando ainda era um jovem guitarrista prodígio. Toda esta experiência está estampada claramente na fina produção de "The Quest". Podemos dizer que este é um disco leve e limpo em sonoridade, sem excessos, onde tudo se encontra no seu devido lugar, tecnicamente, uma mixagem muito refinada, onde as frequências e timbres estão muito bem distribuídas no espectro, neste sentido, o álbum brilha.
    As músicas trazem uma sensação de que este é o conjunto de canções mais suaves gravadas pela banda até então, com muitas canções com presença de violões na base e de uma cama de teclados muito bem feita, sem virtuosismos, mas com timbres que se encaixam com exatidão no acompanhamento das músicas, e intervenções solistas pontuais e muito bem arranjadas. Isto é fruto da maturidade de todos os músicos.
    Aproveitando e falando um pouco deles, o vocalista Jon Davison, que tem um registro de voz semelhante ao de Jon Anderson (chegando com facilidade em frequências agudas), parece que realmente está bem à vontade nesta encarnação do Yes. Ele já está na banda desde fevereiro de 2012 e já havia gravado o álbum de estúdio anterior, "Heaven and Earth", que já apontava o caminho por onde o Yes estaria seguindo no decorrer destas décadas recentes do século XXI, um ponto de mutação por muitos mal compreendido. Que fique claro que com esta afirmação, não estou comparando com a brilhante carreira de Jon Anderson no Yes, mas afirmando que a chama de sua música vem sendo competentemente reverenciada, ao mesmo tempo que novos horizontes são vislumbrados. Como falei anteriormente, considero todos como insubstituíveis, e a pegada de Jon Anderson na história da música universal é gigante.
    Voltemos a outro Jon, o Davison. Desde o início de sua presença no grupo, e entre um álbum e outro gravado, várias turnês tocando álbuns clássicos do Yes na íntegra e outras seleções de músicas de todas as fases, deu ao vocalista uma grande intimidade com o repertório da banda. Billy Sherwood, que ronda a história do Yes desde o lançamento do álbum Union", já havia participado de outras encarnações da banda, mesmo que não oficialmente. As linhas de baixo em "The Quest", são muito bem compostas, dialogando o tempo todo com as melodias principais. A ele, a impossível missão de substituir o gigante Chirs Squire, o que ele vem fazendo com honra e amor, também pela amizade e proximidade musical que teve com "the fish", mas contribuindo e trazendo seu próprio estilo, conseguindo criar estas belíssimas linhas de baixo que encontramos em "The Quest", além de participar das harmonias vocais junto a Howe e Davison. Por falar nisso, os arranjos vocais são pontos altos do álbum, as harmonizações vocais são muito presentes nas faixas e enriquecem bastante a sonoridade das músicas, muitas vezes agindo de forma contrapontística.
    Geoff Downes é um parceiro antigo de Howe, desde os tempos do álbum Drama e de diversos álbuns do considerado supergrupo Asia, passando pela gravação do álbum "Fly From Here", que teve uma boa recepção de crítica e público. Geoff também participa das gravações do Heaven and Earth e de diversas turnês desde a época de "Fly From Here", já acumulando um tanto de experiências com a Yes music e quatro álbuns de estúdio gravados. A Downes ficou destinada a missão de criar um estilo próprio no Yes, sob a sombra do virtuoso Rick Wakeman, e do pioneiro Tony Kaye, e ele vem cumprindo este papel com muita competência. Podemos dizer que dentre os três principais tecladistas que já passaram pela banda, Kaye, Wakeman e Downes, cada um deles tem uma personalidade musical bem distinta e marcante. Downes se destaca bastante como acompanhador, criando timbres que casam muito bem com os novos rumos traçados pela banda.
    Para concluir digo que, independente dos que acham que este é um Yes verdadeiro ou não, e eu não entro neste mérito neste texto, pois há fãs muito calorosos neste debate, os quais não me interessa convencer de uma coisa ou outra. O que me importa é, você gosta e acha bom este momento da banda? aproveite a música que o álbum está sendo muito bem reconhecido internacionalmente, ou, se você não reconhece, não gosta, maravilha também, continue ouvindo os mesmos álbuns que te conectaram com a Yesmusic. Quem está certo? está todo mundo certo, certo no que quer e em como consegue perceber, ninguém deve querer convencer ninguém. O que é fundamental é que, para mim, "The Quest" é um momento de celebração muito especial de uma banda que já é mais que cinquentenária. Eu me sinto feliz por ser contemporâneo deste momento, e de ser contemplado por este trabalho.
    Nestes meus quase 30 anos trabalhando profissionalmente com música, reconheço um grande valor neste álbum, onde, na flor da experiência, a humildade de afirmar que ainda existe uma busca.




Anderson Mariano
Texto feito para o Laboratório de Guitarra Elétrica e Música Universal (LGEMU-UFPB).

domingo, 28 de junho de 2020

DICA DE ÁLBUM: Bright Size Life (Pat Metheny) - 1976 (ECM)




Olá pessoal,

O álbum que quero compartilhar com vocês, e que tive ouvindo recentemente, é o primeiro da discografia de Pat Metheny como um bandleader, Bright Size Life (Link para o spotify), lançado no ano de 1976 pela ECM. 

Este álbum tem uma das formações que mais aprecio, o famoso Guitar Trio, composto por Guitarra, Baixo e bateria (Apesar de que várias músicas tem mais de uma guitarra gravadas por Pat). A formação é genial, Pat Metheny na guitarra, Jaco Pastorius no contrabaixo e Bob Moses na Bateria.

Pat utiliza, além de uma guitarra de seis cordas, também uma guitarra elétrica de 12 cordas. Todas as músicas são compostas por Pat Metheny, com exceção da faixa 08 (Round Trio/Broadway Blues), a qual o trio interpreta duas composições de Ornette Coleman.

Uma das coisas que me chamam atenção nesta obra é a valorização da melodia pelos três instrumentistas, sim, até a bateria parece cantar... E como são belas as melodias e o diálogo entre estes três excelentes músicos.

Quando este disco foi lançado Pat Metheny tinha 21 anos e já demonstrava um amadurecimento musical impressionante.

A gravação foi feita em dezembro de 1975, com Martin Wieland como engenheiro de som e produção de Manfred Eicher.

Foto da capa: Rainer Kiedrowski

Abaixo, a sequencia das músicas:

1. Bright Size Life (4:45)
2. Sirabhorn (5:29)
3. Unity Village (3:40)
4. Missouri Uncompromised (4:21)
5. Midwestern Nights Dream (6:00)
6. Unquity Road (3:35)
7. Omaha Celebration (4:18)
8. Round Trip/Broadway Blues (4:58) - (Ornett Coleman)

Tempo Total: 37:06

Para quem compreende inglês  pode ouvir o próprio Pat falando a respeito de seu debut album 

Entrevista Pat Metheny Bright Size Life

sábado, 13 de junho de 2020

O SISTEMA DE DIGITAÇÕES “POSICION PLAYING” DE WILLIAM G. LEAVITT

 


O SISTEMA DE DIGITAÇÕES “POSICION PLAYING” DE WILLIAM G. LEAVITT

TEXTO: PROFESSOR DR. ANDERSON MARIANO

PROFESSOR DE GUITARRA ELÉTRICA DO DEPARTAMENTO DE MÚSICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

 

Foto: Willian G. Leavitt

 

CONHECENDO WILLIAM G. LEAVITT

 

Um dos primeiros autores que nortearam alguns fundamentos na perspectiva do processo de ensino formal da guitarra elétrica, em relação à produção e organização de uma metodologia de ensino sistemática, foi o norte-americano William George Leavitt, conhecido como Bill Leavit, que nos apresenta um sistema de entendimento do braço da guitarra elétrica “por posição”, conceito que iremos abordar mais à frente neste texto. 

William G. Leavitt, nasceu em 04 de outubro de 1926 e desencarnou em 04 de novembro de 1990, foi professor, guitarrista e arranjador de jazz, mas se tornou mundialmente conhecido pelos seus livros. Estes livros se tornaram base para o programa de guitarra elétrica da Berklee College of music (localizada na cidade de Boston, estado de Massachusetts). No período de sua docência, e até hoje, estes livros estão entre os mais importantes para a bibliografia da guitarra elétrica em todo mundo. A Berklee também foi uma instituição pioneira na elaboração de cursos de bacharelado em música popular a partir de sua fundação no ano de 1945. Em relação ao ensino superior em guitarra elétrica, também é creditado o pioneirismo à Berklee College of Music.

Nesta universidade, na fase inicial dos cursos de música popular, os professores procuravam adaptar materiais da música erudita para o ensino dos instrumentos com o viés e as peculiaridades da música popular, elaborando novos materiais didáticos para suprir as necessidades da implementação da música popular em seu currículo. 

O primeiro guitarrista a assumir a cadeira de guitarra elétrica no Berklee College of Music foi Jack Leroy Petersen, entre os anos de 1962 e 1965. Leavitt iniciou seus estudos acadêmicos no Berklee College of Music em 1948, tendo se graduado em 1951. Em 1965 foi-lhe oferecida a cadeira de guitarra elétrica da instituição, quando ele começou a desenvolver seus métodos de guitarra, que se tornaram mundialmente conhecidos. 

Os estudos dos cursos de música popular no Berklee College of Music, e especificamente de guitarra elétrica, neste período inicial, eram direcionados principalmente ao jazz. Com a expansão do ensino em música popular nos Estados Unidos e em outras regiões do globo, outras vertentes da música popular foram sendo admitidas pelas universidades, e hoje podemos ver diversos cursos na área de produção de música pop, culturas étnicas, e uma possibilidade de abrangência de abordagens de diversos outros gêneros, apesar de o jazz ainda se manter como a maior influência metodológica dentro do contexto acadêmico do ensino da guitarra elétrica no mundo. 

 

Em 1948, William Leavitt foi o terceiro aluno que tocava guitarra a ser aceito na Berklee, se formando em 1951. Em 1965, foi lhe oferecido o cargo de chefe para organizar o então recém-criado departamento de guitarra da própria Berklee e começou a escrever os três volumes do “A Modern Method For Guitar” e os livros associados. Parte do material do livro foi inspirado e recebeu contribuição do colega educador e guitarrista Jack Peterson (Birch, 2013).  William Leavitt é considerado o pioneiro no estudo de guitarra elétrica com o uso de palheta no ensino superior. O seu método estabelece uma base sólida em termos de leitura, técnica e harmonia. O objetivo era treinar um guitarrista nas habilidades consideradas fundamentais, não sendo um estudo que treinaria para desenvolver a técnica de um estilo musical definido, como jazz ou rock (Birch, 2013, APUD ZAFANI, 2014, p. 33).

 

Willian G. Leavitt foi um guitarrista, professor de guitarra e arranjador de Jazz norte americano, mas se destacou muito por seus livros e por ocupar a cadeira de professor de guitarra elétrica da Berklee College o f Music de 1965 a 1990, tendo uma influência profunda no currículo de guitarra desta instituição, e consequentemente, expandindo-se para outros horizontes. 

Sua visão de formação do guitarrista é apresentada basicamente em seus três volumes do “A Modern Method for Guitar”. Os métodos de Leavitt (com exceção do “Classical Studies for Pick-Style Guitar”) foram todos desenvolvidos com estudos e repertório originais, onde são abordados conteúdos de melodia (escalas e arpejos), harmonia (acordes, condução de vozes e funcionalidade), improvisação, técnica, palhetada, repertório, estudos de leitura à primeira vista e estudos de “levadas rítmicas” para mão direita, entre outros, bem como, dá subsídios ao estudante para a prática de improvisação (apesar de não trabalhar este tópico evidentemente ou diretamente) a partir dos conceitos trabalhados em seus livros e do aprofundamento do conhecimento das possibilidades de digitação pelo braço da guitarra elétrica.

 


Foto: capa do volume único do “A Modern Method for Guitar” (W. Leavitt).

 

A escolha pelos métodos do autor para servir de base e inspiração para uma observação mais criteriosa se deu devido ao entendimento da importância desta escola metodológica para a área da guitarra elétrica em nível global e de sua influência, bem como pela constatação de uma escassa bibliografia no Brasil que reflita sobre esta produção, que traz como base um conceito bem elaborado de estudo por posição, que também pode servir como ponto de referência terminológico central para a compreensão de diversas outras metodologias ou sistemas de digitação. 

Pela sua ampla abrangência consideramos uma abordagem significativa, no sentido do reconhecimento do braço do instrumento, e que, este sistema, dentro de si, pode subsidiar outras possibilidades de entendimento de sistemas de digitação na guitarra elétrica.

 

Um dos grandes problemas a serem dominados pelo professor de guitarra é conhecer o objetivo metodológico do método utilizado por ele. A maioria desenvolve seu trabalho como professor, onde segue os estudos e exercícios do livro, sem traduzir, ao aluno, sua significação e representação, como objeto teórico/prático pedagógico, não conseguindo resultados satisfatórios (PACHECO, 2005, p. 04).

 

Muitos métodos e livros atuais trabalham com uma boa variedade de recursos, como o (1) uso de diagramas do braço da guitarra associado às partituras ou tablaturas e textos; (2) gravações com playbacks para a prática dos assuntos em contextos técnicos, práticos e de improvisação; (3) exercícios propostos e explicação dos conteúdos abordados em vídeo-aulas associadas; (4) criação de grupos em redes sociais e salas de aulas virtuais para estimular reflexões e facilitar a comunicação entre o professor/autor e estudantes, etc. 

Todos estes recursos citados, em uso atualmente, e muitos outros que estão disponíveis, também podem auxiliar o trabalho de sala de aula do professor de música, além de proporcionar acesso mais facilitado a todos os estudantes interessados no material que vem ser utilizado.

Este texto visa trazer uma reflexão a partir de uma experiência pessoal desenvolvida em nosso estudo e com a experiência de ensino que temos com estudantes de guitarra elétrica que instruímos com o uso desta filosofia de ensino, entre outras que, naturalmente, são trabalhadas paralelamente.

 

O CONCEITO CENTRAL

 

William G. Leavitt, em seus volumes do “A Modern Method For Guitar” trabalha o conceito de “posicion playing”, que podemos traduzir como “tocando por posição”, se referindo à localização da mão esquerda no braço do instrumento e às suas diversas possibilidades de digitação. 

A posição básica em que está localizada a mão esquerda no braço é centrada na disposição dos dedos 1, 2, 3 e 4, sendo caracterizada por estes estarem localizados naturalmente em casas vizinhas. Desta maneira, pode-se determinar a posição pela localização do dedo 1 no braço quando todos os dedos estão dispostos em casas vizinhas. Por exemplo, dedo 1 na primeira casa, primeira posição, dedo 1 na quinta casa, quinta posição, e assim por diante. No entanto, existem três variações desta postura básica da mão esquerda, devido ao uso de aberturas dos dedos 1 e 4, sem que haja mudança de posição. 

 

    Foto: Segunda posição (disposição natural dos dedos em casas vizinhas).

  

A primeira variação é a abertura do dedo 1, mantendo os dedos 2, 3 e 4 em casas vizinhas; a segunda variação é a abertura do dedo 4, ficando os dedos 1, 2 e 3 em casas vizinhas; a terceira variação é a abertura de ambos os dedos, 1 e 4, ficando os dedos 2 e 3 em casas vizinhas. 

 

    Foto: Segunda posição (abertura do dedo 1).

 

    Foto: Segunda posição (abertura do dedo 4).

 

Nestes casos de abertura, para exata determinação da posição, tomamos como base o dedo 2, da seguinte maneira: na casa que o dedo 2 estiver, a posição é determinada em uma casa anterior. Por exemplo, dedo 2 na quarta casa, terceira posição, dedo 2 na décima terceira casa, décima segunda posição, e assim por diante. 

Esta forma de localizar a posição pela localização do dedo 2 é mais segura, e também serve, naturalmente, para a posição natural, com todos os dedos posicionados em casas vizinhas (já que nenhuma destas variações trabalha com abertura do dedo 2). Desta forma, usamos como referência principal para a determinação da posição, a localização do dedo 2. Na casa que o dedo 2 estiver, subtraímos uma e aí está a nossa posição.

Dentro de nossa perspectiva pedagógica, procuramos manter e desenvolver o conceito de estudo de guitarra elétrica por posição, como é apresentado por William G. Leavitt nos três volumes da obra “A Modern Method For Guitar”, que se apresentam em níveis básico, intermediário e avançado, respectivamente.  A partir desta concepção de estudo e digitações verticalizadas no braço do instrumento, também nos propomos a refletir a respeito de mecanismos de movimentação diagonal e horizontal pelo braço, em relação às direcionalidades do movimento da mão esquerda, através de soluções de mudanças de posição em arpejos e escalas. 

Posso sintetizar os passos para alcançar os objetivos propostos para execução desta abordagem nos seguintes pontos gerais:

 

  • Leitura e prática integral dos exercícios propostos nos três volumes “ A Modern Method for guitar”, para obter um conhecimento prático e abrangente da proposta do autor
  • Posterior separação de todo material dos três volumes em alguns tópicos básicos, tais como: 1- Escalas; 2- Arpejos, 3- Acordes e Harmonia, 4- Guitarra rítmica, etc, para entender a progressão do desenvolvimento dos estudos em cada um destes tópicos no decorrer dos volumes. 
  • Observação e levantamento das particularidades de cada digitação proposta pelo autor, visualizando facilidades e possíveis dificuldades. 
  • Ideias para possibilidades de aplicação e adaptação de diferentes técnicas de palhetada nos padrões de digitação dos exercícios propostos, utilizando principalmente as possibilidades de palhetada alternada e palhetada varrida (Sweep Picking), entre outras, de acordo com a prática do estudante.
  • Outro ponto fundamental é a organização de um conjunto de exercícios de base que favoreçam a prática da técnica necessária para uma boa execução, melhor desenvolvimento e compreensão deste sistema de padrões de digitação das escalas, arpejos e acordes propostos, associado a práticas pedagógicas que favoreçam o uso prático deste sistema.

 

A IMPORTÂNCIA DE SUA METODOLOGIA

 

Estes volumes que estamos abordando neste texto foram criados com o intuito de fundamentar o ensino de Guitarra Elétrica no Berklee College of Music, no período inicial de sua implantação, quando o professor William Leavitt assume a cadeira de guitarra elétrica desta instituição, mas também são de fundamental importância estes outros métodos lançados pelo mesmo autor, como o “Reading Studies for Guitar”, “Advanced Reading Studies for Guitar”, “Melodic Rhythms for Guitar”, “Classical Studies for Pick-Style Guitar”, “Beklee basic guitar: phase 1”, e “Berklee Basic Guitar: phase 2”. 

Estes métodos são basilares para se compreender o caminho traçado inicialmente pelo ensino de instrumento guitarra elétrica em contexto acadêmico, por terem sido utilizados no primeiro curso superior de guitarra elétrica que se tem conhecimento. Foram fundamentados com base em metodologias clássicas de ensino de instrumentos tradicionais e da música erudita. “Apesar de tratar de técnicas e posições específicas da guitarra elétrica, seu material possui forte apelo à leitura musical tradicional (partitura, pentagrama) ” (GARCIA, 2011, p. 51).

Todos estes livros do autor podem ser considerados referência mundial em termos de estudo e ensino da guitarra elétrica, se complementam e dialogam entre si. No entanto, aparentemente ainda não existe no mercado brasileiro um material que trabalhe ou traga reflexões mais aprofundadas a partir deste ponto de vista das doze posições ou doze digitações por posição (posicion playing), que é a sua proposta mais aprofundada de estudo dos caminhos de digitação pelo braço do instrumento que o autor apresenta. 

A grande parte dos métodos e livros encontrados em minha revisão bibliográfica, escritos por autores brasileiros, focam no sistema 5 (de cinco padrões de digitação) ou CAGED, que é um sistema simplificado, bem como no sistema de sete padrões de digitação que usam três notas por corda, ou outros sistemas que também compreendem sete digitações.

Utilizamos este conceito de posição apresentado por William Leavitt para abordar todos os sistemas de digitações que conhecemos, como o sistema 5 (CAGED) e os sistemas 7 (de sete digitações pelo braço). Os mais populares sistemas que trabalham com sete digitações focam em digitações diagonais com três notas por corda e também em possibilidades de organização do estudo das digitações de forma mais verticalizada, em sete modelos de digitação numa mesma posição ou numa mesma região com pequenas mudanças de posição para se evitar abertura dos dedos da mão esquerda. Mesmo nas aplicações mais horizontalizadas, que utilizam um conjunto mais restrito de cordas para o desenvolvimento das digitações de escalas e arpejos (consequentemente, gerando mudanças frequentes de posição), pensamos dentro deste conceito apresentado por Leavitt para um melhor entendimento do caminhar pelo braço. 

O sistema de digitação proposto por William Leavitt trabalha basicamente com digitações respeitando uma mesma posição, utilizando, para isto, além do posicionamento padrão e natural dos dedos da mão esquerda na posição, com estes posicionados em casas vizinhas, as possibilidades de aberturas dos dedos 1 e 4 da mão esquerda (ou de ambos os dedos em algumas digitações). Nestes outros sistemas com 5 e 7 digitações percorrendo o braço do instrumento, as quais foram citados anteriormente, também é comum observarmos digitações com mudanças de posição, trabalhando-se com posições vizinhas compreendendo uma determinada região em seus desenhos ou modelos padrões. 

Para amadurecermos nossa compreensão do sistema de doze posições proposto por Leavitt em seu terceiro volume da série “A Modern Method For Guitar”, procuramos desenvolver uma observação crítica a respeito dos três volumes, em relação a como ele vem apresentando gradativamente os fundamentos deste conceito, trabalhando inicialmente com cinco digitações nos primeiros volumes e posteriormente ampliado para doze digitações no volume terceiro. Neste movimento, podemos fazer observações e levantamento de vantagens e possíveis desvantagens da maneira como são tratados os assuntos pelo sistema de estudo por posição e pelo sistema de doze digitações, a partir de reflexões de experiências pessoais práticas e de aplicação desta proposta em experiências de ensino. 

Esta construção tem como base uma observação minuciosa de como este assunto é tratado nos métodos citados, que nos deram a base de compreensão do que reconhecemos como as digitações que cada posição contém em seus diversos desenhos pelo braço da guitarra. 

Focamos nossa atenção na abordagem de estudo do instrumento pelo reconhecimento e prática sistemática das possibilidades de digitação de escalas, acordes e arpejos em cada posição no braço da guitarra, denominada pelo autor de “posicion playing”, dando igual importância a cada uma das doze digitações geradas por este sistema, até a repetição dos padrões de digitação a partir de uma nova oitava de cada digitação de escala ou arpejo praticadas. 

Também procuramos contemplar as peculiaridades da primeira posição aberta, ou seja, da primeira posição com uso de cordas soltas. 

 

UM POUCO MAIS A RESPEITO DE SUA CONTRIBUIÇÃO

 

Podemos imaginar como se deram os primeiros passos na sistematização do ensino da música popular e dos instrumentos que antes não tinham uma escola específica, como é o caso da guitarra elétrica, um jovem instrumento, com cerca de trinta anos, quando os esforços de William Leavitt para trazer uma metodologia consistente de ensino culminaram no material que este produziu, trazendo uma fundamentação bibliográfica para o ensino da guitarra elétrica dentro da academia. 

A referência que estes pioneiros do ensino da guitarra elétrica tinham, eram dos métodos de ensino instrumental da música de concerto, já consolidados por séculos de experiência e publicações. Sempre que algo traz uma inovação, é necessária uma base para que esta inovação se estabeleça, base trazida invariavelmente pela ancestralidade, pelas experiências que já foram vividas, e neste caso do ensino de um instrumento tão jovem e tão diferenciado dos instrumentos tradicionais, pelo fato de ser eletrificado, a base veio dos métodos tradicionais de outros instrumentos, que já existiam anteriormente como escola sedimentada, trazendo inspiração para a criação de uma metodologia posteriormente emancipada de ensino gradual para a guitarra elétrica.

 

William Leavitt, editou vários livros, entre os quais, “A modern Method for guitar”, em três volumes, compreendendo um grande número de matérias, desde os princípios básicos até temas mais aprofundados, como o reconhecimento das posições de um número variado de escalas e acordes. Cada tópico é acompanhado por uma sequência de exercícios para o desenvolvimento rítmico, melódico e harmônico, além de pequenas peças envolvendo uma ou mais guitarras. Pode-se até dizer que esta série de volumes se tornou um item praticamente obrigatório para o ensino do instrumento, pois houve a preocupação em formular uma base literária sólida para uma linguagem historicamente nova, emergente da pura intuição e destreza natural de seus pioneiros, e que precisava ser sistematizada (MEDEIROS FILHO, 2002, p. 13)

 

Estes métodos de Wiliian G. Leavitt, tem uma proposta didática ampla, apesar de vermos bastante utilizados direcionado ao jazz, podemos entender que sua proposta de estudo do instrumento pode abrir-se para diversas vertentes, pois o autor procura dar ao instrumentista as ferramentas necessárias para ele se desenvolver em qualquer estilo. Em sua proposta de trabalho, nos três volumes dos livros “A modern method for guitar”, o autor não trabalha com fraseados pré-estabelecidos ou característicos de um gênero ou outro, mas sim, com o mapeamento do braço, posição a posição. 

O volume 1 do “Modern Method For Guitar”, está organizado em duas sessões, a primeira sessão lida exclusivamente com a primeira posição aberta, ou seja, com a mão localizada próximo à pestana da guitarra, com os dedos 1, 2, 3 e 4 tocando respectivamente as notas das casas 1, 2, 3 e 4, priorizando o uso de cordas soltas. Na segunda sessão são apresentados cinco modelos de digitação de escalas maiores, sempre em exercícios onde é preciso ler as notas na partitura para o aprendizado da digitação. Estes modelos podem ser usados em cada uma das demais posições do braço, pois são modelos móveis. 

O trabalho, nesta segunda sessão do volume 1, é feito com exercícios nas segunda, terceira e quarta posições, privilegiando-se as escalas de cada posição que podem ser executadas com os cinco modelos básicos de digitação apresentados. É importante frisar que cada um destes modelos é executado dentro de uma mesma posição, sem mudança alguma de posição em cada modelo, mantendo a mão esquerda preferencialmente fixa na posição, podendo haver apenas os movimentos de abertura dos dedos 1 ou 4 da mão esquerda para alcançar as notas da escala ou arpejo. Estes modelos de digitação são, por conseguinte, verticalizados ou verticais. 

Em todos os livros da série “Modern Method For Guitar” os assuntos são apresentados numa sequência progressiva de dificuldade, e também são trabalhados diversos assuntos a cada grupo de páginas, ou seja, não há um foco específico por assunto. Por exemplo, no volume 1, temos nas páginas 60 e 61, exercícios de escala, seguidos por exercícios de arpejo na página 61, acordes na página 62, um dueto na página 63 e estudos de leitura à primeira vista na página 64. Todo o método segue nesta maneira de organização, variando apenas a sequência dos temas abordados apresentados em grau de dificuldade crescente. 

Na maneira que organizamos os conteúdos, baseados no sistema de posições, após uma leitura completa dos volumes, também sugerimos organizar e trabalhar os assuntos por tópicos específicos, como em cadernos separados, determinando alguns temas gerais, como por exemplo, escalas, arpejos, acordes, repertório e guitarra rítmica, entre outros. Cada um destes temas gerais pode ser estudado em diversos focos, tendo como eixo o sistema de estudo por posição e posteriormente o sistema de doze posições gerado por este. Queremos reforçar que mesmo quando tratamos de outros sistemas de digitação, também nos baseamos no conceito de localização da mão esquerda neste sistema apresentado por Leavitt para localizar e nomear as posições das digitações. 

Em nossa abordagem didática, sob influência dos caminhos propostos pelo autor, mas já assimilando e incluindo outras experiências pessoais, inicialmente, trabalhamos com a proposição de exercícios de base, criados e desenvolvidos especificamente para se ter maior consciência da posição em que está tocando e para aprimoramento técnico, associando sempre a parte mecânica estudada com o desenvolvimento do viés criativo em contextos de criação musical, interpretação, improvisação e composição.

 Pessoalmente, em nosso trabalho, as escalas são observadas inicialmente em suas digitações verticais, primordialmente em cinco modelos básicos de digitação por posição ou com pequenas mudanças de posição em uma mesma região, e depois expandidas para sete modelos básicos, expandindo mais uma vez para doze modelos em um aprofundamento do reconhecimento das possibilidades de digitação pelo braço. Também costumamos apresentar modelos com mudança de posição para adaptação das digitações anteriores, de maneira que não se digite com abertura de dedos, mas sim com a opção da movimentação da mão esquerda para uma posição vizinha acima ou abaixo da posição original, tocando posições vizinhas para se manter numa mesma região. Outros modelos que trabalhamos são os que se estruturam com mudança de posição e se apresentam com direcionamento diagonal pelo braço, devido seus padrões de três ou quatro notas por corda. 

Independente do sistema de digitação, a abordagem sempre é feita dentro da perspectiva da localização de cada posição da mão esquerda e de seus dedos, da maneira como é conceituado por Leavitt. Mesmo quando a digitação abrange mais de uma posição, trabalhamos o entendimento de onde a mão está localizada, se há abertura de dedos e outros aspectos que nos deixem conscientes da localização da mão esquerda no braço do instrumento. 

É no volume 2 do método que o autor começa a trabalhar as digitações caminhando todo o braço, abrindo a perspectiva horizontal do estudo de reconhecimento a partir das digitações verticais. As digitações verticalizadas por posição se mantém, no entanto, são estudados mecanismos de mudanças para posições vizinhas, dentro dos mesmos padrões de digitação de escalas estudados no volume 1. 

O sistema de doze posições é apresentado apenas no volume 3 do método, para o guitarrista em nível mais avançado, pois algumas digitações são de difícil execução, como aquelas que exercitam a abertura do dedo 4, principalmente no início do estudo deste sistema mais ampliado. As maiores dificuldades em digitações que nós encontramos nas proposições de Leavitt são aquelas que trabalham com a abertura do dedo 4 da mão esquerda, as quais também podem ser substituídas por outras soluções de digitação na mesma região, normalmente, através de pequenas mudanças de posição. 

Este sistema de doze posições é assim denominado por mim, adaptando o termo posicion playng cunhado por Leavitt, devido ao fato de oferecer a possibilidade de digitar cada escala ou arpejo no instrumento de doze maneiras diferentes, em doze posições diferentes, com o uso das fôrmas ou desenhos de digitação que trabalham a posição natural dos dedos da mão esquerda no braço ou de suas possibilidades de abertura dos dedos 1 e 4. 

A partir desta perspectiva, somam-se ainda as possibilidades da primeira posição aberta, ou seja, com uso de cordas soltas, que formam padrões inerentes a esta posição. Podemos considerar esta maneira de pensar o instrumento, reconhecendo-se cada posição, um recurso que faz parte de seu idioma, devido a maneira que é construído o instrumento.

O verbete “idiomático” (idiomatic), no The new Havard dictionary of music, explica que idiomatismo significa “exploração das capacidades particulares do instrumento. Estas capacidades podem incluir timbres, registros e meios de articulação, como também combinações de alturas que são mais facilmente produzidas em um instrumento do que em outro (Randel, 1986 APUD VASCONCELOS, 2003, p. 80). 

Neste nosso estudo, observamos como as qualidades idiomáticas da guitarra elétrica em relação ao sistema de digitação por localização da posição podem contribuir na formação do instrumentista, dando-lhe uma visão mais ampla do braço do instrumento e de comunicação de suas possibilidades, bem como das maneiras de se caminhar por este, entre formações de escalas, arpejos e acordes.

Para finalizar nosso texto, compartilhamos esta composição de John Grady e William Leavitt, denominada "My Baby's Coming Home", popular na época de seu lançamento e interpretada aqui por Les Paul e Mary Ford,  lançado como lado A de um single em vinyl 7'' e 45 RPM pela capitol (2265) em 1952 (o lado B continha uma interpretação instrumental de Les Paul da música "Lady of Spain", de Erell Reaves e Tolchard Evans). Esta interpretação foi uma das quais Les Paul e Mary Ford alcançaram o Top 10 do Pop Charts norte americano durante a década de 1950:




 

BIBLIOGRAFIA

 

CELEBRATING BERKLEE'S FACULTY PIONEERS. site: Berklee.edu. Disponível em https://www.berklee.edu/berklee-today/spring-2014/celebrating-berklees-faculty-pioneers, acesso em 12/06/2020.

GARCIA, Marcos da Rosa. Ensino e aprendizagem de guitarra em espaços músico- educacionais  diversos  de  João Pessoa. Orientador: Luis Ricardo Silva Queiroz. Dissertação (Mestrado em Música). João Pessoa, 2011.

LEAVITT, William G. – A Modern Method For Guitar Vol. I. Boston: Berklee Press Publications, 1966.

LEAVITT, William G. – A Modern Method For Guitar Vol. II. Boston: Berklee Press Publications, 1968.

LEAVITT, William G. – A Modern Method For Guitar Vol. III. Boston: Berklee Press Publications, 1966.

LEAVITT, William G. – Classical Studies for Pick Style Guitar. Boston: Berklee Press Publications, 1965.

LEAVITT, William G. – Melodic Rhythms for Guitar. Boston: Berklee Press Publications, 1969.

LEAVITT, William G. – Reading Studies For Guitar. Boston: Berklee Press Publications, 1979.

LEAVITT, William G. – Advanced Reading Studies for  Guitar. Boston: Berklee Press Publications, 1981.

MEDEIROS FILHO, João Barreto de. Guitarra elétrica: um método para o estudo do aspecto criativo de melodias aplicadas às escalas modais de improvisação jazzística. Dissertação de mestrado, Campinas (UNICAMP), Instituto de Artes, SP, 2002.

PACHECO, Fernando. Tradução intersemiótica no ensino superior de guitarra elétrica no Brasil. Anais... XIV Encontro Anual da ABEM. Belo Horizonte. Outubro. 2005.

VASCONCELOS, Marcus André Varela. Recursos Idiomáticos em Scordaturas na Criação do Repertório para Violão". Autor. Dissertação de mestrado. Orientador: Marcos Siqueira Cavalcante, Unicamp, 2003.

ZAFANI, Jose Tadeu Dutra Zafani. “Ensino de guitarra e violão: uma construção social e pessoal”. Dissertação (mestrado), Orientador: Jorge Luiz Schroeder, Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes. Campinas, SP, 2014.

 

sexta-feira, 5 de junho de 2020


Apresentação ao violão solo da música "Constelação", de Anderson Mariano, no dia 05/07/2013 em concerto de estreia da "OSUFPB Pop", na "Sala Radegundis Feitosa". Registrado por C2P vídeos.

sábado, 30 de maio de 2020

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sexta-feira, 29 de maio de 2020

CONSIDERAÇÕES SOBRE O SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DA GUITARRA ELÉTRICA


ANDERSON MARIANO

CURSO SUPERIOR DE GUITARRA ELÉTRICA

UFPB




Resumo: Este texto traz algumas informações sobre o processo de surgimento da guitarra elétrica, e também sobre o seu desenvolvimento a partir da década de 1930. O ensino acadêmico deste instrumento no Brasil vem ganhando cada vez mais força, principalmente com a sua institucionalização nos cursos superiores, e este texto visa trazer uma contribuição nesta área através de uma abordagem histórica, e para tal, são utilizados como referência alguns autores que vêm refletindo sobre as peculiaridades do instrumento e de seu desenvolvimento na linha do tempo.

 

Palavras-chave: Guitarra elétrica, História da Guitarra Elétrica, Desenvolvimento histórico.


Title of the Paper in English: Some appointments about the appearance and development of the electric guitar 


Abstract: This text have some informations about the process of appearance of the electric guitar, as well, about its development since the 1930’s. The academic teaching of this instrument in Brazil has been increased with more and more power, Mainly with its institutionalization in under graduate courses, and this text try to give one more contribution in this theme, by a historic view, and for this, are used some reference authors that come reflecting about its peculiarity and development on the timeline.


Keywords: Elecrtic guitar, History of Electric Guitar, Historic Development.


As teorias eletromagnéticas que vieram se desenvolvendo ativamente nos anos finais do século XIX deram embasamento para o desenvolvimento de certas tecnologias no início do século XX. Entre estas, podemos citar a captação e ampliação sonora,  a comunicação à distância através do telefone, e a propagação sonora através de ondas de rádio. Estes aprimoramentos científicos que adentraram o século XX foram fundamentais para a posterior idealização e criação de um instrumento que representa muito bem o avanço tecnológico que os resultados de tais pesquisas trouxe, a Guitarra Elétrica. 

No início do século XX o violão fazia parte dos naipes de acompanhamento das “big bands” de jazz norte-americanas. Sua limitação de projeção sonora em relação aos instrumentos de sopro não possibilitava outra função, se não a de acompanhamento rítmico-harmônico, muitas vezes junto ao banjo. Adrian Ingram, pesquisador, educador e instrumentista reconhecido como uma das maiores autoridades na guitarra jazzística cita: 

Os primeiros experimentos conhecidos (além daqueles usando fonógrafos e telefones) foram os captadores eletrostáticos. Estes eram aparelhos elétricos que transmitiam as vibrações da guitarra a partir do corpo ao invés de diretamente acima ou abaixo das cordas. Lloyd Loar, um designer pioneiro durante o início dos anos 1920, foi um forte defensor deste sistema, e junto com seu colega L.A. Willians, produziu muitos protótipos de guitarra elétrica [...] Willians e Loar colaram um captador eletrostático na parte de dentro da madeira da guitarra (superior). O cabo elétrico e o plug de conexão passavam diretamente através do cavalete, que era localizado na borda inferior. Existiam muitos problemas inerentes no design destes captadores (INGRAM, 2001, pp.8-9)


.

Foto: Captador eletrostático fabricado por Lloyd Loar em guitarra Acústica eletrificada da fábrica Vivi-tone.


Em meados da década de 1920 as “guitarras ressonadoras”, também conhecidas como “dobro” se tornaram populares, tinham mais sonoridade que o violão tradicional, assim como uma notável diferença timbrística. 

               Foto: National Resophonic Guitar


Por volta de 1931, George Beauchamp, Paul Barth e Adolph Rickenbacker produziram um captador magnético capaz de transformar em tensão elétrica as vibrações mecânicas das cordas de aço. Ele foi lançado em uma guitarra Lap-steel, que se toca deitada sobre algum apoio, com um tubo de metal ou vidro realizando o papel de um traste móvel (muito utilizada na música havaiana). Sobre estes primeiros instrumentos Adrian Ingram esclarece que:

O instrumento protótipo feito à mão tinha um pequeno corpo redondo e um longo braço, foi inicialmente nomeado de Fry pan, mas os historiadores e colecionadores corromperam esta terminologia para “frying pan”. Em 1932, Beauchamp e Barth formaram sua própria companhia junto com Adolph Rickenbacker. A nova companhia adotou o curioso nome de Ro-Pat-In e começou a manufaturar versões de alumínio da Lap Steel Fry pan .  (INGRAM, 2001, p. 10).



Foto: Primeira Frying Pan, datada de 1931


A adaptação desta tecnologia com captadores magnéticos, para violões, gerou alguns problemas, principalmente devido às realimentações das vibrações das cordas em relação ao corpo do instrumento, bem como problemas de distorções do som original. Em 1936, a “Gibson Company” lança comercialmente o modelo ES150, uma “Archtop jazz guitar” com um captador elétrico embutido. A partir daí, o instrumento poderia tocar linhas melódicas e ser ouvido frente às jazz bands, projetando-se sonoramente no nível dos trompetes, saxofones e outros instrumentos. 

Foto: Gibson ES-150 1936


Um pioneiro dessa geração nos Estados Unidos foi Charlie Christian (1916-1942), guitarrista da era do jazz swing, considerado um dos precursores do bebop, cuja influência estilística enraíza-se até hoje na história da guitarra elétrica. Vejamos estes comentários de Steve Waskman a respeito de Charlie Christian e esta fase inicial da guitarra elétrica:

Desde pelo menos os anos 1960, a guitarra elétrica tem sido o principal instrumento solo da música popular, e os guitarristas tem se tornado heróis venerados sobre quem muitos fãs giram em torno de sua música. O que não era o caso dos anos 1930. Durante os anos de 1930 e o início dos anos 1940, a guitarra elétrica foi transformada num instrumento solista por músicos como Charlie Christian. Apesar de não ter sido o primeiro a tocar guitarra elétrica, Christian usou os novos sons produzidos pelo instrumento para criar um estilo de single note, trazendo a guitarra elétrica para fora do seu confinamento na seção rítmica. Com Christian a guitarra elétrica passou a ter mais “presença” instrumental, no nível dos instrumentos de sopro que dominavam o estilo do jazz swing do momento [...] A guitarra elétrica o seguiu em seu movimento de um herói local de jazz para o virtuoso do swing, e em seguida para o inovador do proto-bebop. Através destas transições e transformações, a guitarra tinha se auto-transformado como instrumento musical e como um objeto comercial (WASKMAN, 2001, pp. 14-16).

 Esta transformação do instrumento em um objeto comercial e popular é claramente observada atualmente nas escolas e universidades de música, onde a guitarra elétrica figura sempre entre os instrumentos mais procurados, e também no mercado informal da música, onde normalmente é um instrumento obrigatório nas formações de diversos grupos. 

Outros nomes importantes nesta fase inicial do instrumento, considerando instrumentistas de fora do Brasil foram Django Reinhardt (1910-1953), Wes Montgomery (1925-1968), Johnny Smith (1922-2013), George Van Eps (1913-1998), Les Paul (1915-2009), Joe Pass (1929-1994), Grant Green (1935-1979), Kenny Burrel (1931), Tal Farlow (1921-1998), Herb Ellis (1921-2010), Barney Kessel (1923-2004), T-Bone Walker (1910-1975), Muddy Waters (1915-1983), Elmore James (1918-1963), Howling Wolf (1910-1976), B.B. King (1925), Bill Haley (1925-1981), Bo Didley (1928-2008), entre muitos outros. 

A partir da década de 1950, o instrumento passou por um intenso processo de popularização, principalmente com o surgimento do Rock’n’Roll, tornando-se um dos símbolos icônicos desse gênero, e paralelo a isso, paulatinamente, de uma indústria cultural de massa. Também foi na década de 1950 que as guitarras de corpo sólido se popularizaram. “Em 1949, a Fender desenvolveu o modelo Telecaster, lançado em 1950. Em 1952, a Gibson lançou o modelo Les Paul; e em 1954 a Fender, o modelo Stratocaster” (MARTIN, 1998, p. 105). Estes três modelos tornaram-se standards e são base do design de várias outras companhias que os copiam até hoje.

A guitarra elétrica é um instrumento de muita versatilidade, com possibilidades melódicas, contrapontísticas, harmônicas e multi-timbrísticas. Nisto incluem-se possibilidades de criação de ruídos e diversas outras sonoridades, principalmente quando o instrumento está associado a diversos efeitos de manipulação do som, além de atuar em si mesmo como uma interface sonora. Observemos abaixo uma descrição do processamento sonoro da guitarra elétrica: 

A geração sonora da guitarra elétrica depende de uma dupla transdução: o captador transforma as vibrações mecânicas das cordas em tensão elétrica, o alto-falante converte essa tensão elétrica em ondas sonoras. É exatamente nesse estágio intermediário – o do sinal elétrico – que se inserem as principais possibilidades de ampliação e de modificação dos recursos do instrumento, advindas da micro-eletrônica e do processamento digital de sinais (SOARES DE CASTRO, 2007, p.1).

Atualmente a guitarra elétrica é presente em diversos gêneros de música popular, e cada vez mais é utilizada na música de concerto. “Fazendo-se o som menos dependente das qualidades físicas inerentes do instrumento, a guitarra elétrica expandiu tanto a extensão de sons disponíveis como a extensão de técnicas usadas para viabilizar e disponibilizar estes sons” (WASKMAN, 2001, p. 292). O seu uso é comum em diversos ambientes culturais, do rock ao jazz, da bossa nova ao “heavy metal”, do reggae ao carimbó, do samba ao funk, tendo uma evidente penetração na cultura de massa e consequentemente uma participação efetiva na indústria cultural. Sobre a variedade estilística no uso da guitarra elétrica, podemos observar que:

Não existe tal correlação entre a guitarra elétrica e sua música. A forma de tocar de Wes Montgomery e Jimi Hendrix, Hank Marvin e Thurston Moore, Albert Lee e Kurt Cobain são exemplos típicos de músicas completamente opostas emanando essencialmente do mesmo instrumento. Por causa de a guitarra elétrica significar muitas coisas diferentes para pessoas diferentes, é impossível prever seu futuro com qualquer grau de certeza. Um desenvolvimento encorajador é o fato de a guitarra elétrica está sendo incluída em escolas de música e conservatórios (INGRAM, 2001, p.93).

Apesar de este instrumento ter uma ligação direta com o universo da música dita popular, diversos compositores/instrumentistas contemporâneos também se interessaram por levar a guitarra elétrica ao ambiente orquestral. Como exemplo pode-se citar Pat Metheny (em um concerto em que interpreta composições suas com a Metropole Orchestra regida por Jim McNeely, em 2003), John Maclaughlin (interpretando o seu Mediterranean Concerto for Guitar and Orchestra junto à London Symphony Orchestra regida por Michael Tilson Thomas, em 1988), Steve Vai (interpretando suas composições com a Metropole orchestra no álbum Visual Sounds Theories, de 2005), Yngwie Malmsteen (no Concerto Suite For Electric Guitar And Orchestra in E Flat Minor com a the New Japan Philharmonic, em 2003), entre outros. Isto mostra o quanto o instrumento tem transitado entre os mais diversos ambientes musicais. 

O guitarrista Frank Zappa é outro nome que se propôs frequentemente a transitar entre o universo orquestral e jazzístico com influências do rock. Um exemplo disso é o álbum de Zappa, lançado em 1984; Boulez conducts Zappa: The Perfect Strange, gravado no IRCAM em Paris, com composições de Zappa, sendo três destas regidas por Pierre Boulez e interpretadas pelo Ensemble InterContemporain (The perfect Strange, Naval Aviation in Art? e Dupree’s Paradise). A vanguarda da música de concerto e a vanguarda do rock se encontram neste álbum

Outro exemplo que podemos citar é a obra Vampyr!, de Tristan Murrail, para guitarra elétrica solo, que vem com a indicação na partitura para “tocar como um guitarrista de rock”. O álbum SYR4: Goodbye 20th century (1999) da banda norte-americana Sonic Youth, traz interpretações de composições de John Cage, Yoko Ono, Steve Reich e Cornelius Cardew, entre outros.

O guitarrista Lou Reed lançou um álbum experimental em 1975, denominado Metal Machine Music, no qual explora exaustivamente o feedback que ocorre ao aproximar a guitarra do amplificador, em diversas velocidades. As guitarras usadas eram afinadas de maneiras não usuais e o instrumento foi associado a diferentes níveis de efeitos de reverberação. O resultado sonoro são camadas de microfonias superpostas durante todo o álbum. Basicamente, Lou Reed trabalha com ruídos que a guitarra pode projetar associada ao amplificador, estando dessa forma sintonizado com as pesquisas de vanguarda na música pós modernista, que buscavam explorar profundamente o fenômeno timbrístico e as novas possibilidades de sonoridades advindas da eletrônica.

Estes exemplos citados comprovam este feedback entre diferentes estéticas, estilos e ambientes, aos quais a guitarra elétrica pode transitar, pois este instrumento traz em sua bagagem uma vasta gama de possibilidades, se fazendo presente em tantos e tão distintos repertórios, e se apresentando atualmente com diversas sonoridades distintas, todas estas, provenientes de um mesmo instrumento, o qual que vem sempre se alinhando com o desenvolvimento tecnológico do universos eletrônicos, analógicos e digitais. Desde seu surgimento, por ser um instrumento caracteristicamente elétrico e poder receber tantas possibilidades de manipulação do som, através de técnicas, pedais de efeitos, sintetizadores e outras possibilidades a guitarra elétrica é uma admirável interface de geração de múltiplas sonoridades.


Referências:



BORDA, Rogério. Por uma proposta curricular de curso superior em guitarra elétrica, 2005. Orientador: José Nunes Fernandes. Dissertação (Mestrado em Música) – Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2005.



COELHO, Victor Anand. The cambridge companion to the guitar. Cambridge university press, 2003.



INGRAM, Adrian. A concise History of the electric guitar. Mel Bay publications, 2001.



SOARES DE CASTRO, Guilherme Augusto.  Guitarra elétrica: entre o instrumento e a interface, Anppom 2007.



WASKMAN, Steve. Instruments of desire: The electric guitar and the shaping of musical expirience. Havard University press, 1999.